Os Marginais
de Porto Alegre
Certa vez perguntaram ao filósofo Diógenes – que também foi um “marginal” e um sem teto na Grécia Antiga – por que ele pedia esmola a uma estátua. Ele respondeu, solenemente, que estava se habituando à recusa e, sobretudo, treinando para suportar quem não o via e não o sentia, como se sua presença fosse um grande nada! A genial resposta de Diógenes ilustra os propósitos desta obra: suportar, ver e sentir aqueles que hoje são “nadas sociais” para a burguesia, a classe média e a grande mídia – em síntese, para a sociedade oficial.
Estamos tão atarefados com as questões do dia-a-dia que supostamente garantem a nossa sobrevivência, que muitas vezes não temos sequer tempo para a família, os filhos, os amigos – e isso vivendo na mesma cidade e às vezes na mesma casa! Somos minados por uma lógica enlouquecedora que nos afasta do círculo mais próximo, que dirá pensarmos na gente que não tem teto? É como aquela canção dos Engenheiros do Havaí, crônica, que diz o seguinte: “mais um louco pede troco na esquina; tudo isso já faz parte da rotina e a rotina já faz parte de você”!
Foi justamente por isso que Raquel Silveira e Lucas Berton propuseram dar vida a este projeto: trazer à luz da consciência estas centenas de milhares de pessoas que vivem vagando nas ruas, como párias, tirando-as da escuridão do inconsciente rotineiro que nos domina e esmaga – como se a culpa de estarem ali fosse única e exclusivamente delas –, para demonstrar os seus dramas, que não são menos importantes do que os nossos. Se “tudo isso faz parte da rotina”, cabe a nós mudarmos essa rotina; e para isso, o primeiro passo é trazer esta rotina para o consciente, com todas as suas contradições, e para o debate e a reflexão pública.
Neste livro, os textos e as fotografias se encontraram com o objetivo de denunciar o mundo ao nosso redor e trazem as marcas dos caminhantes, observadores e pensadores que somos; aliás, como muitos de nós também o são